quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

AVENTURA

Em meus sertões, há um incrível hiato,
Canudos arde em fogo e seu beato
Nào parece pensar em rendição!
Cansanção, escanção, canção, cansaço,
plantas cegas que se espalham neste espaço,
feras verdes que me ferem a cada passo,
ajudai-me a atingir-lhe o coração!

Em meus sertões, há abismal fissura,
barro hidratado, encrespada criatura,
deserto aberto, caatinga da loucura,
só me falta o Conselheiro da Ilusão.

Salvação, solução, cancão, abraço,
certo espelho encravado no meu traço,
ave brava que escapa do meu laço,'
eu preciso confessar minha paixão!

Povoado guarda o sol e mais serpente,
nessa falha, feno e pó, saliva ardente,
só sossega tanto ardor urina quente
que jorrada já simule o amor ausente.

Seduçào, oh cansançào, não me atormentes!

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

MORRER SEM MORRER
(Poema dedicado a S. V. - Porque minhas palavras nos pertencem. E ninguém irá desviá-las da luz!)

Como se fosse um lírio
que se abre,
um delírio
que em mim não cabe,
um sabre,
cortando a luz....
eu ouço
o verso que traduz
tua chegada

E toda essa morada
que me encerra treme
e toda a terra que me esmaga
geme
em meio ao fogo que queima e purifica,
em meio à água que em mim habita
o rio das canções que jamais cantarei...!

Sinto que chegas como o sol
na hora em que ele some
ou como a ave de rapina que consome
a minha treva e a minha dor ,
dizimando a minha fome!

Finalmente, quando em ti os olhos ponho
eu sei que amar
é morrer sem morrer
é, assim, meu amor,
como se morre em sonho!


Em 08/12/2009

segunda-feira, 7 de setembro de 2009


Caros Leitores,


Amem-me pelos perigos que eu passar e saberei amá-los por sua piedade.


Mirella Márcia

sábado, 29 de agosto de 2009

MODOS DE TOCAR

Às vezes tu me tocas,
como quem dedilha
as cordas de uma harpa...
Ou, como quem zarpa
para uma ilha
no céu...
e estando a levitar
cria um castelo
no ar
que habita...!
Eremita
em doces vales,
barqueiro dos mares meus,
arqueiro de Deus
que usa dedos como flecha
salvando a vida em cada mecha
de cabelo que toca
com emoçao,
tu me tanges nessas horas
como quem semeia um grão
no paraíso
e tens, no tato, o riso
dos fiéis
durante a oração.
E então...
como quem faz prece,
ou como um menino
tocando violino
para peixes à luz do luar,
tu portas na mão
a ternura do algodào
que veste e abraça,
causando o estado de graça
de quem baila no ar,
tal fumaça
que voa devagar.

Mas , outras vezes...
tu me tocas como quem pisa
sem ver que, no solo, agoniza
a vida,
a pétala ferida
na brisa
do mar ...
Tu provocas o gemido
ouvido
em outro lugar
e o teu gesto é martírio,
exílio,
filho sem lar,
canto de ave desconhecida...
porque tocas
como quem extermina,
como o ladrão que tira
a boneca da menina
brincando no jardim...
Quando tocas assim,
tu ages como quem rasga
um pergaminho,
ou como quem derrama o vinho
guardado para o instante final...
Impedes a pastoral,
quando, ao tocar em mim,
tu imolas
e, imolando,
violas
a fada que pede esmolas
nas asas de um querubim.

Desse jeito,
tu trazes o desmazelo
de quem corta
e o desespero da enxada
que evoca
a vida
na terra morta,
és maldição sem apelo
de quem nem sabe o que toca.