quinta-feira, 1 de setembro de 2011

AGRADECIMENTO


Agradeço a todos que foram, ontem, ao Ciranda Café, para o lançamento do livro "A Torre Infinita." Sem dúvida, foi uma linda festa. Mirella Márcia Longo (Em 31/08/2011)

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Sobre o livro "A Torre Infinita"

Há anos, publiquei "O Curso das Águas. " Apesar de estar na plena imaturidade, ali refleti sobre o fluir da existência. Depois, surgiram um estudo sobre os poemas de amor de Drummond, um livro de crônicas, vários ensaios. Hoje, volto ao verso, constatando que ele é um bem de raiz. Meu livro é muito pequeno e, no entanto, a sua escrita exigiu uma energia imensa. São 35 sonetos e um poema mais longo. Ligados entre si, esses textos trazem um único tema que se impõs, ao modo das obsessões: a perda e a luta para superá-la; a queda e a tentativa de levantar; o desmoronamento íntimo e a recomposição dos espaços interiores. Em palavras diretas: os meus poemas falam da morte e do esforço realizado para renascer.

Em um ensaio sobre Hamlet, Lacan observa que a face intolerável oferecida pela morte à dimensão humana não é a experiência da própria morte, porque, de fato, ninguém vive a própria morte. Vivemos a morte de um outro.

Meus poemas contêm experiências de perdas. Suas imagens são projetadas a partir das forças que brotam do amor, nos momentos em que a ausência de um ser querido torna-se o centro pulsante do universo. Nessa cratera, a vida lateja, como se a escuridão fosse o lugar onde a luz consegue revelar a sua fulguração mais cegante. Ao levitarmos nesse abismo entre o nada e a criação, somos sustentados pelo ser que perdemos. Porque perdemos e, mesmo assim, amamos: eis o paradoxo. Dentro dele nos movemos insensatamente, absurdamente, assim como Dante moveu-se na direção de Beatriz: ( Ilustro com o poema XXI)

Mesmo feita em pedaços, tu me elevas,
torre sem asa que me arrasta à casa
do sol. Arrasada és lume entre trevas
e a tua decadência minha alma abrasa,

não importa a era glacial. Eu faço
do teu rastro uma espiral e então passo
à distância do grito mais agudo
e tudo o que te imploro é um gesto mudo.

Espanta este silício do meu dia!
Encanta-me com a tua melodia
suspensa na mais vasta liberdade!

Esgota-me contemplar essa mania
tua de reter no sopro a verdade!
Estanca esta sangria da saudade!


Desnecessário declarar a gênesis das minhas imagens. Foi para suportar a vertigem da queda, que eu imitei a chuva; foi para vencer o frio, que vislumbrei em ovelhas azuis uma lã de máxima espessura. Quando o ser perdido vibra em nós e nos obriga a respirar em outro ritmo, a voz oscila. Às vezes, balbuciamos, levados a recompor os vínculos entre som e sentido, entre linguagem e mundo.

Escrevi os poemas que compõem "A Torre Infinita", ao longo de anos. Um primeiro conjunto surgiu em 96. Em 2002, outro surto aconteceu e, finalmente, entre 2009 e 2010, veio um terceiro grupo. Parei de escrever o livro, quando percebi que a minha dicção começava a mudar. Nessa hora, senti que, embora a torre fosse infinita - pois é sempre incessante o anseio de ascender do pântano ao céu - os poemas já continham a parcela de infinito que poderiam conter.

Mirella Márcia Longo
( Trechos do depoimento apresentado em 20/7/2011, na cidade de Faro, Algarve, Portugal - durante o X Congresso da Associaçào Internacional de Lusitanistas)



terça-feira, 9 de agosto de 2011

domingo, 20 de junho de 2010

Saramago

SARAMAGO
Desde a última sexta-feira, recebo mensagens de pessoas preocupadas comigo, por conta do desaparecimento de Saramago. A todas respondi que estava serena, embora sinta muitíssimo a morte desse homem extraordinariamente lúcido. Muitos escritores marcaram a minha vida, nenhum como ele. Em 1987, fiz, na Ufba, uma palestra sobre "Memorial do Convento". Em abril do ano seguinte, apresentei comunicação sobre o mesmo livro, num Congresso de literaturas em língua portuguesa, realizado na USP. Estava nervosa. São Paulo esfriara bastante e eu tinha crises de tosses terríveis. Ao chegar na sala, alguém perguntou se falaria sobre Saramago. Confirmei. Então a moça indicou-me o senhor, sentado na primeira fila. Era ele, o escritor português, ainda pouco conhecido no Brasil. Tremi, mas a tosse não veio. Quando acabei de falar, Saramago e Pilar del Rio - com quem casara havia pouco tempo - vieram cumprimentar-me. Gostaram! Solicitaram o meu texto. À noite, pedi que autografasse o meu exemplar do "Memorial". Declarando, com generosidade, a sua admiração e a sua estima, Saramago agradecia-me sensibilidade e inteligência, acrescentando: "se tal pode ser agradecido". Pela primeira vez, eu falara fora da Bahia. Foi um batismo de fogo. Reencontrei o escritor em outras três ocasiões. Em 1990, presenciei, já como doutoranda da USP, a sua magnífica aula sobre Literatura e História. Consegui que fizesse dedicatória no meu exemplar de "Objecto Quase". Em artigo sobre a sua obra, comento "Desforra", conto dessa coletânea,onde também se encontra "O centauro". Em mais de uma oportunidade, ouvi Saramago dizer que, entre todos os textos que escrevera, preferia esse. Trata-se da história do último centauro. Narrando o momento doloroso em que o homem é separado do cavalo, Saramago grifa o nosso afastamento da natureza. Sem dúvida, o motivo está no centro da sua literatura.
Revi Saramago, logo após o anúncio do NobeL, no Congresso da Associaçào Internacional de Lusitanistas, realizado no Rio de Janeiro. Ele receberia o título de Doutor Honoris Causa, pela Universidade Federal Fluminense. Pouco antes de entrar no ônibus que me conduziria a Niterói, fui a uma banca de revistas e lá o encontrei. Conversamos um pouquinho, fiquei feliz. Na cerimônia solene, foi homenageado por uma orquestra fluminense. A regência ficava a cargo de uma mulher, loura e vibrante. Não me escapou o fascínio no olhar do escritor. Anos mais tarde, ao ler "As Intermitências da morte", lembrei-me bastante da cena. O romance de 2005 é sensacional, embora pouco compreendido pela crítica. Dividido em duas partes, tem a segunda centrada na vida de um músico. Diante da orquestra, a morte, em forma de mulher, deslumbra-se, como eu vira deslumbrar-se o autor, ante a bela regente. Ao receber o título, em Niterói, Saramago fez um discurso brilhante. Comovida, pedi que jamais calasse, que usasse o poder do Nobel, para protestar contra a retração das utopias e do humanismo, na cultura contemporânea. Emocionado, prometeu que tentaria... que estava tentando fazer aquilo mesmo que eu pedia.
Em novembro de 2000, pude reencontrá-lo, em Lisboa, no lançamento do livro "A Caverna." Novamente um discurso marcante, tesouro que guardo na memória. Pessoalmente, não mais estive com ele, embora o tenha sempre acompanhado de longe. Continuei lendo os seus livros, escrevendo sobre eles e publicando os meus comentários. Agora, terei que reler tudo, buscando novos aspectos. O universo criado por Saramago é tão complexo quanto a vida que chamamos de real.
Mas ninguém passa de serralheiro mecânico a prêmio Nobel impunemente. Ele desagradou a muitos. Não me refiro àqueles que criticam as suas posições políticas, ou as suas declarações. Penso nos que torcem o rosto para a sua obra, muitas vezes sem ter lido. Acho quase impossível não gostar de livros como "O ano da morte de Ricardo Reis", "Todos os Nomes" (a mais pungente história de amor que conheço) e "As Intermitências da morte" . E eu poderia ficar aqui registrando, a noite inteira, a riqueza que acho na escrita do autor português. Seria cansativo. Destaco dois aspectos. O primeiro é o seu humanismo. O amor à humanidade toma todo o espaço da sua obra. Sua literatura é uma longa louvação às criações humanas, ao trabalho, à arte. O segundo é a fé depositada no laço entre mulher e homem.
Encerro esta declaração de amor a Saramago, retomando o meu ponto de partida. Sentindo dor pela morte do escritor português, fico serena, ao lembrar as palavras que ele dirigiu a Pilar del Rio. Foram mais ou menos assim: "se eu tivesse morrido antes de conhecer-te, aos 63 anos, morreria muito mais velho do que serei, no dia em que me fôr." Não é preciso lamentar a ausência desse homem excepcional, que conseguiu morrer aos 87 anos, no esplendor da juventude. Basta que o admiremos. Mirella Márcia

domingo, 21 de março de 2010

ALQUIMIA

Dor da vida,
quando tocares o corpo do meu amado
sente o perfume que lá deixei
e embriagada fenece.
Mas transfigurada reaparece
lírio ou mulher
amando o homem que tanto amei.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

AVENTURA

Em meus sertões, há um incrível hiato,
Canudos arde em fogo e seu beato
Nào parece pensar em rendição!
Cansanção, escanção, canção, cansaço,
plantas cegas que se espalham neste espaço,
feras verdes que me ferem a cada passo,
ajudai-me a atingir-lhe o coração!

Em meus sertões, há abismal fissura,
barro hidratado, encrespada criatura,
deserto aberto, caatinga da loucura,
só me falta o Conselheiro da Ilusão.

Salvação, solução, cancão, abraço,
certo espelho encravado no meu traço,
ave brava que escapa do meu laço,'
eu preciso confessar minha paixão!

Povoado guarda o sol e mais serpente,
nessa falha, feno e pó, saliva ardente,
só sossega tanto ardor urina quente
que jorrada já simule o amor ausente.

Seduçào, oh cansançào, não me atormentes!

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

MORRER SEM MORRER
(Poema dedicado a S. V. - Porque minhas palavras nos pertencem. E ninguém irá desviá-las da luz!)

Como se fosse um lírio
que se abre,
um delírio
que em mim não cabe,
um sabre,
cortando a luz....
eu ouço
o verso que traduz
tua chegada

E toda essa morada
que me encerra treme
e toda a terra que me esmaga
geme
em meio ao fogo que queima e purifica,
em meio à água que em mim habita
o rio das canções que jamais cantarei...!

Sinto que chegas como o sol
na hora em que ele some
ou como a ave de rapina que consome
a minha treva e a minha dor ,
dizimando a minha fome!

Finalmente, quando em ti os olhos ponho
eu sei que amar
é morrer sem morrer
é, assim, meu amor,
como se morre em sonho!


Em 08/12/2009